Está (de volta) às às mãos da Câmara dos Deputados decidir o futuro de um benefício em vigor há 40 anos: a conhecida “saidinha dos presos”. A restrição foi aprovada por maioria — 62 votos a favor e dois contra — no Senado na noite da última terça-feira (20) e revoga as saídas esporádicas, que aconteciam em datas festivas e feriados.
Na avaliação do cientista político André César, a decisão tomada pelo Senado é correta, já que parte dos presos que saem cometem crimes quando estão fora da cadeia. Mas, para ele, a decisão deve ser amplamente debatida, inclusive com a sociedade civil.
“É preciso repensar esse modelo e processo — e é fundamental o Congresso discutir o tema, é inevitável. E a partir disso vamos avançar e aprofundar o debate.”
Hoje, a Lei 7.210/1984<\/a> prevê a saidinha para os presos com bom comportamento, que cumprem pena em regime semiaberto e já cumpriram um sexto da pena. As saídas acontecem cerca de cinco vezes ao ano, em datas especiais, como o Dia das mães e Natal. No período fora da prisão, não há vigilância direta e os beneficiados podem visitar a família, estudar fora da cadeia ou participar de atividades que contribuam para a ressocialização.
Ressocialização, o motivo do benefício
“A saidinha faz parte de um projeto de ressocialização do preso, que visa aos poucos, reintegrar o preso à sociedade” — a explicação sobre o benefício é do especialista em segurança pública e presidente do Instituto de Criminalística e Ciências Policiais da América Latina, José Ricardo Bandeira.
E, segundo o especialista, retirar esse benefício é punir quem está indo no caminho correto pelo erro de outros. A explicação é baseada na estatística de que 95% dos que saem, voltam para a prisão e 5% não voltam.
“Essa lei está punindo 95% dos presos, que têm bom comportamento, que cumprem a saidinha e retornam para os presídios — baseado somente nos 5% dos presos que não voltam. Isso seria o equivalente ao exemplo de cassar as carteiras de motoristas de todos os condutores do Brasil porque 5% deles dirigem alcoolizados.”
De janeiro a junho de 2023, 120.244 presos tiveram acesso à saída temporária em todo o país, segundo dados da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), do Ministério da Justiça. Desses, 7.630 não retornaram, se atrasaram na volta à unidade prisional ou cometeram uma falta no período da saída — o que representa uma parcela de 6,3% do total de beneficiados.
Os cerca de 5% que não voltam
São Paulo, o estado mais populoso do país, tem também a maior população carcerária do Brasil. Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado, até o fim de 2023 eram 197 mil presos — desses, cerca de 35 mil — tinham direito às saídas. No ano passado, 1.560 não retornaram aos presídios, pouco menos de 5%.
Além de não voltarem para a prisão, parte dos presos que saem cometem crimes nessas saidinhas. O especialista em segurança pública ainda explica que dos 5% que não voltam à prisão, “normalmente são reincidentes nos crimes que os levaram à prisão.” Ricardo Bandeira explica que se ele foi condenado por furto, roubo, tráfico, eles costumam cometer crimes da mesma natureza.”
Ele ainda explica que muitos deles cometem os crimes na saidinha e voltam para o presídio no prazo estabelecido, “isso não é incomum e vale lembrar que estamos lidando com criminosos — e faz parte do processo”.
O preso que sai e comete qualquer crime perde o direito ao benefício E pode ter a regressão do regime e voltar a cumprir pena em regime fechado.
Pelo texto aprovado no Senado, as saídas temporárias ainda serão permitidas, mas apenas para presos inscritos em cursos profissionalizantes ou nos ensinos médio e superior E somente pelo tempo necessário para essas atividades. O texto agora volta para a Câmara dos Deputados e só depois segue para a sanção ou veto do presidente Lula.
A “saidinha” de presos pode estar perto do final, no Brasil. Foto: Wilson Dias/Agência Brasil