O Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, tem apenas quatro escolas de ensino médio. Juntas elas têm 2.267 alunos matriculados. O número corresponde a 31,6% do total de 7.162 jovens de 15 a 18 anos que vivem na região. Os dados foram divulgados durante a 5ª edição do Seminário de Educação da Maré, realizada nos dias 27 e 28 de agosto, e fazem parte do relatório divulgado pela Redes da Maré.
No conjunto de 15 favelas da Maré, há atualmente 49 escolas públicas, sendo 45 municipais e quatro estaduais, num total de 19.537 estudantes. “Também cabe ponderar que esse número relativamente alto de escolas na Maré é recente e ainda insuficiente para atender as mais de 41 mil crianças e adolescentes de zero a 17 anos que moram no bairro”, diz o documento.
Segundo o relatório, o trabalho da equipe do Toda Menina na Escola, nas 15 favelas do complexo, mostra que são múltiplas as causas que levam crianças e adolescentes a se afastarem das escolas ou jamais terem sido matriculados. Trata-se de uma camada da população vulnerabilizada, na qual, na maioria dos casos, as mães são as chefes e as únicas responsáveis em seus lares.
“A educação pública nas favelas do Rio de Janeiro é uma questão complexa e desafiadora, extremamente importante para se compreender o cenário educacional da cidade e do país como um todo. A desigualdade socioespacial é uma característica comum em muitas grandes cidades, com disparidades sociais entre diferentes áreas e bairros. Fatores que levam à desigualdade socioespacial são distribuição desigual de recursos, segregação residencial, disparidades de renda e emprego, acessibilidade e transporte, além da violência”, diz o documento.
De acordo com o Censo Populacional da Maré, em 2013, 53,47% de seus habitantes não tinham completado o Ensino Fundamental. Já a taxa de analfabetos entre pessoas a partir de 15 anos correspondia a 6% da população, sendo mais da metade mulheres.
Segundo o relatório, as escolas da Maré frequentemente enfrentam problemas relacionados à infraestrutura precária, falta de recursos, déficit de professores, turmas superlotadas e carência de materiais didáticos adequados. Esses fatores acabaram afetando diretamente a qualidade do ensino oferecido.
“Os altos índices de violência afetam diretamente o quadro de insegurança nas escolas e o percurso dos alunos às unidades escolares. A existência de confrontos armados em horário escolar prejudica diretamente o acesso à educação e o bem-estar dos estudantes e professores. Além do receio de mobilidade de famílias e estudantes, especialmente adolescentes do sexo masculino, as escolas da Maré são fechadas regularmente por conta de operações policiais no território. Em 2022, 62% das operações policiais na Maré foram realizadas próximo a escolas e creches e, somente em 2023, foram 25 dias de aulas suspensas em decorrência de operações policiais”, diz o relatório.
Operações policiais
O Ministério da Educação (MEC) sugeriu a criação de um grupo de trabalho ou uma comissão para discutir os impactos de operações policiais no funcionamento do sistema educacional, bem como formas de reparação em casos onde ocorrem o fechamento de escolas e a suspensão de aulas.
A proposta surge em resposta aos questionamentos encaminhados pelo Ministério Público Federal (MPF), por meio da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão. Há duas semanas, a instituição solicitou ao MEC informações sobre a existência de uma diretriz nacional sobre o impacto das operações policiais no sistema educacional e uma forma de reparação, para que os alunos não carreguem esse déficit durante toda a trajetória escolar.
No Rio de Janeiro, onde a situação é corriqueira, levantamentos registram números alarmantes. No Complexo da Maré, um boletim produzido pela organização Redes da Maré indica que, entre 2016 e 2023, foram 146 dias com aulas suspensas e escolas fechadas em decorrência de operações policiais.
© Tânia Rêgo/Agência Brasil