Eleita pela segunda vez campeã como cidade “Amiga da Internet” — prêmio concedido pelo SindiTelebrasil e pela Associação Brasileira de Infraestrutura para as Telecomunicações (Abrintel) — São José dos Campos, em São Paulo, tem muito o que ensinar aos gestores municipais no que diz respeito à conectividade.
Entre as dicas de sucesso estão a desburocratização no setor de telecomunicações, a modernização da legislação e a criação de um ambiente favorável para a inovação. O amplo espaço geográfico do município não foi visto como um obstáculo, mas uma oportunidade. “Aqui precisamos, realmente, investir em sistemas de transmissão de internet, de rádio e fibra ótica”, afirma José de Mello Correa, secretário de Gestão Administrativa e Finanças de São José dos Campos.
As explicações para o case de sucesso são muitas. Uma delas é a Lei de Inovação, que permitiu que empresas testem equipamentos de LED e Wi-Fi nos postes e nas praças da cidade, por exemplo. Outra iniciativa foi o Prefbook, uma plataforma que permite que cada morador de São José dos Campos tenha uma página própria em que ele pode acessar todos os serviços da prefeitura de forma personalizada.
“Ele [o cidadão] pode acessar todos os seus documentos, carnês, processos, em uma página específica. Com isso, começamos a diminuir os protocolos físicos, que ajudaram a cidade na pandemia a fazer com que as pessoas pudessem ter acesso de casa a todos os serviços da prefeitura”, detalha José.
Transformação
O projeto de cidade inteligente é idealizado no conceito “Smart City as a service”. A ideia foi investir em um plano que não se torne obsoleto com o avanço da tecnologia, mas que consiga se aperfeiçoar ao longo dos anos. Está tudo conectado. Prédios da administração pública, praças e as mais de 180 escolas do município têm acesso à internet. Nos espaços públicos, ela é gratuita ao cidadão.
Na segurança pública, a instalação de um novo centro de inteligência com cerca de 1000 câmeras, a implantação de leds em toda a estrutura de iluminação pública, de câmeras nas lapelas de todos os guardas municipais, entre outras iniciativas, diminuíram alguns crimes na cidade, como roubo e furto de veículos, por exemplo.
José de Mello explica os inúmeros benefícios que a modernização tecnológica trouxe para a gestão do município. “Vamos conseguir detectar o movimento de pessoas, [fazer] reconhecimento facial no centro da cidade, rastrear cidadãos, objetos e veículos por cor, tempo de permanência de alguém que fica muito parado no mesmo local, estacionamento irregular, detecção de densidade de pessoas, quem está com máscara, sem máscara…”, enumera.
O caminho
Para Ricardo Dieckmann, gerente de Infraestrutura do SindiTelebrasil, o primeiro passo para que os municípios se tornem “amigos da internet” é criar uma lei que permita o funcionamento das antenas em linha com as normas federais sobre o tema. “Muitas leis são defasadas e isso dificulta as empresas de telecomunicações de instalar essa infraestrutura. Se você não tem as antenas instaladas, o celular não serve para nada. Por isso, é importante que essa legislação seja menos burocratizada e aderente à lei federal”, aconselha.
Ele afirma que há três barreiras que os gestores municipais costumam enfrentar para modernizar as cidades. A primeira delas é a burocracia, com muitas leis que pedem um calhamaço de documentos, considerados por ele “desnecessários”. Em segundo lugar, a culpa é da própria administração, que demora e, às vezes, sequer responde às empresas de telecomunicações sobre um pedido de instalação.
Por último, ele cita restrições para a disposição da infraestrutura. “Por exemplo, de [a empresa] não poder instalar antena em determinada região da cidade: Ora, se você não pode instalar antena naquela região, os moradores não terão serviço”, afirma.
Prioridade
São José dos Campos, Santo André e João Pessoa, todas consideradas “cidades amigas da internet ou cidades inteligentes” têm muitos pontos em comum. E um dos mais importantes é tratar as telecomunicações e a tecnologia como prioridade. “O primeiro e o mais importante é a visão da cidade de que isso é primordial para o bem-estar do cidadão e para o desenvolvimento. A partir daí, a prefeitura busca os caminhos para chegar nessa situação”, acredita Dieckmann.
Para José de Mello, os gestores devem pensar a longo prazo. “Não adianta apenas fazer uma licitação focada em um projeto e daqui quatro anos mudar novamente”. Além disso, ele diz que devem estimular uma mudança na mentalidade da própria administração e da população. “Você tem que criar uma filosofia, treinar o seu pessoal, os servidores públicos, criar um ambiente de comunicação e marketing virtual para que a população se adeque. Aí, sim, desenvolver essas novas tecnologias”, complementa.
Aos que não sabem por onde começar, exemplos não faltam. O SindiTelebrasil, por exemplo, tem uma página com orientações, dicas e até um modelo de Projeto de Lei que os gestores municipais podem usar para destravar o setor em suas cidades. A campeã, São José dos Campos, afirma que já ajudou diversas cidades a darem início ao processo de transformação e que está aberta para trocar experiências com os gestores.
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Conectada
Segunda colocada no ranking de “cidades amigas da internet”, Uberlândia, em Minas Gerais, também está entre as cidades mais inteligentes do país. Visando levar o atendimento remoto para o cidadão, o município percebeu que era preciso investir em infraestrutura. Foram gastos cerca de R$ 4 milhões. A cidade criou um novo portal, que agora permite que a população faça negociação de dívidas, acesse segunda via de documentos e faça solicitações. Posteriormente, todo esse serviço foi disponibilizado também no WhatsApp.
“Entendemos que essas inovações fizeram com que o cidadão de sua casa consiga fazer solicitações sem a necessidade ir à prefeitura de uma maneira ágil e mais precisa”, afirma Reginaldo Mendes, diretor presidente da empresa pública Processamento de Dados de Uberlândia.
A administração local modernizou outras frentes. Na educação, desenvolveu o aplicativo “Escola em casa”, que permitiu aos alunos baixarem o conteúdo das disciplinas e acessar as aulas remotas durante a pandemia. Além disso, todas as escolas do município contam com acesso à internet. Na saúde, implantou-se o atendimento médico virtual, que direciona os pacientes para atendimento na rede pública e, agora, a gestão municipal trabalha em uma plataforma de Telemedicina, onde o cidadão vai poder agendar consultas, por exemplo.
E não para por aí. Há o fomento à cultura, com o projeto “Cultura em casa”, que levou os artistas para dentro dos lares da cidade, incentivando a produção local. Já a ferramenta “Mais Negócios” foi criada para que as empresas cadastrem seus produtos e, por meio disso, os cidadãos possam identificar quais ficam mais próximas do bairro onde moram.